Desde o início da declaração da situação de emergência em saúde pública no Brasil, decretado desde o primeiro trimestre de 2020 em virtude da pandemia de Covid-19, muitas leis e decretos foram publicados no intuito de adequar a vida da população a essa nova situação vivenciada.
Algumas situações eram resolvidas diretamente no judiciário, que foi fundamental em muitos aspectos. Em outras, a atuação direta dos governantes foi essencial.
Uma dessas situações que envolveram e necessitara, de medidas extraordinárias foi a questão de suspensão de fornecimento de serviços essenciais em casos de inadimplência. Com a crise financeira e o previsível aumento de desemprego ou diminuição substancial de renda, muitas pessoas se viram impossibilitadas de realizar pagamentos das despesas mais primárias, dentre elas a que envolve o fornecimento de energia elétrica.
Visando mitigar os efeitos da pandemia para esse tipo de população, o governo do estado do Amazonas editou a Lei nº 5.143/2020, a qual, em síntese, proibiu que as concessionárias e serviços públicos de água e energia elétrica realizassem o corte do fornecimento residencial de seus serviços por falta de pagamento, em situações de extrema gravidade social, incluindo pandemias. Além disso essa lei assegurava ao consumidor que tivesse o fornecimento suspenso o direito de acionar juridicamente a empresa concessionária por perdas e danos, além de desobrigá-lo do pagamento do débito que originou o referido corte.
A entrada em vigor da referida lei fez com que a Abradee – Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica ingressasse com Ação Direta de Inconstitucionalidade questionando o artigo 1º da lei, que é o que determinou que as concessionárias de serviços públicos de energia e água ficassem proibidas de efetuar o corte de fornecimento de energia em caso de inadimplemento, durante a pandemia.
Dentre os argumentos, a associação sustentou que os dispositivos desta lei teriam violado a competência privativa da União para legislar sobre o tema, uma vez que disciplina sobre as consequências financeiras da pandemia sobre a prestação do serviço de energia, além de ser a União quem teria competência material para explorar o serviço.
Instado a se manifestar sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça julgou, por maioria, constitucional a lei do Amazonas.
De relatoria do ministro Marco Aurélio, este consignou em seu voto a improcedência do pedido. Para ele, quando “ausente interferência na atividade-fim das pessoas jurídicas abrangidas pela eficácia dos preceitos impugnados, inexiste usurpação da competência da União”. Além disso, este ressaltou ser legítima a complementação, no âmbito regional, de legislação editada pela União, quando esta visar ampliar a proteção ao consumidor e preservar o fornecimento de serviço público.
Por fim, fundamentou seu voto aduzindo que, considerando a crise sanitária, bem como atendida a razoabilidade, não há que se falar em inconstitucionalidade da legislação estadual.
O voto divergente foi apresentado pelo Ministro Dias Toffoli que consignou que apenas uma norma Federal teria o condão e autonomia para dispor sobre isenção ou adiamentos de pagamentos, sendo que esta matéria sequer estaria incluída no âmbito da competência legislativa concorrente dos Estados. Processo: ADIn 6.588.
Por Vania Eliza Cardoso